2.12.09

Retiradas.*

Conheci Bruno quando o frescor de uma juventude mais que desejada batia à minha porta.
E por ele ter sido, até então, o rapaz mais bonito que houvera se interessado por mim, eu resolvi, naquele momento, que ia deixar ser conquistada. Mesmo que algumas disparidades intelectuais o tornassem um pouco desinteressante, aquilo tinha que acontecer, porque era, acima de tudo, uma injeção de estima para alguém que tinha acabado de ser trocada por outra, descaradamente.
Assim, adolescentemente, nos conhecemos, rimos, ficamos extremamente sem graça, e é incrível como eu ainda sinto o cheiro daquela época, do meu sabonete líquido (que ele por vezes usava para lavar a cabeça), de protetor solar, mas falo disso depois. O que importa é que quando efetivamente nos encontramos, foi algo tão puro e infantil que eu, no auge dos meus 19 anos, jamais poderia imaginar passar - nunca tinha passado, pois mesmo eu queria que as coisas fossem mais maduras, adultas... coisa de menina otária, mesmo, que prefere sempre por o carro à frente dos bois. E é uma lembrança tão maravilhosa que me fez perder a meada de todos os meus outros pensamentos nos dias que antecederam os dias de hoje.
Resolvemos que éramos namorados - ora, nada mais natural. E Bruno tinha tanto respeito por mim, respeito esse que creio jamais ter encontrado em nenhum outro macho - homem ou menino - que eu possa ter me relacionado posteriormente. Ele me cultuava, dizia que queria ser como eu. Me pedia conselhos sobre como fazer a vida dele mudar, conversávamos sobre profissões, escolas, oportunidades, e ele dizia que ia mudar a vida dele para poder ficar comigo. Gostava de mim. Não me amava, mas gostava e respeitava, e isso já era o bastante para um coração machucado, como o meu.
Viajávamos juntos! Ríamos muito. Eu admirava a ingenuidade dele, mas nunca consegui me sentir superior. Talvez porque ele fosse muito bonito. Talvez porque isso não seja do meu feitio, mesmo. Tenho orgulho sim, de mim mesma, mas não suficiente para provar a outras pessoas que sou melhor que elas. Até mostro que sou, mas não humilho ninguém. Bruno, lindo, parecia ator de cinema. Metade do tempo eu passava olhando pra ele, somente. Usava todos os meus perfumes, meus sabonetes, meus cremes, dizia que queria ficar cheiroso como eu. Nossa, como eu sinto o cheiro daquela época. E é um cheiro com frescor de limão e chá verde, energizante. Como uma pérola daquela poderia estar escondida há tanto tempo... tão longe, tão perto.
Não sei em que ponto eu exagerei, ou eu fui evasiva, mas as marcas do passado não foram suficientemente cicatrizadas. Eu não dava a devida atenção que ele me dava, maldita vaidade, não estava preparada para viver outra relação intensa, não na sombra de um relacionamento falido. Quando dei por mim, eu tinha espantado Bruno da minha vida, e do mesmo jeito que ele apareceu, ele se foi.
Bruno foi internado na sexta-feira, dia 27/11, com uma bactéria no pulmão, e de lá do hospital não saiu mais. Morreu no domingo, tendo sido diagnosticado edema pulmonar (os pulmões enchem de água devido a inflamações, e é um quadro gravíssimo). Sempre tive vergonha de assumir que a culpa foi minha de não termos continuado a nossa historinha, e pode parecer ridículo da minha parte contar agora toda ela em tom de crônica, mas não me resta mais nada a fazer. Senti uma saudade cruel daqueles tempos, onde a pouca idade não influenciava e nada a minha liberdade, o contrário do que acontece agora. Senti saudade dele. Vejo as brigas pelo meu sabonete líquido, que era caro, e que pra ele era só um sabão cheiroso, e sinto cheiro de um vazio que eu não me permiti a preencher, mesmo tendo tido a oportunidade de viver tantas coisas interessantes, e conhecido pessoas marcantes. Hoje eu não tenho mais a oportunidade de rir com ele do nosso "tiro no pé", pois ainda éramos amigos e guardávamos o mesmo respeito um pelo outro, além de ainda um quê de afeto, um quê que só percebemos a dimensão quando perdemos a pessoa - enquanto matéria - pra valer. Hoje Bruninho, para mim, é mais que eu pensava. É mais que um punhado de fotos guardadas numa gaveta, testemunhas de um maravilhoso fim de semana numa casa banhada de sol. Bruninho é a lembrança de que eu ainda mereço e devo ser muito feliz. É uma vontade louca de sentir o passado, de buscar o que me encha. E tenho muito o que agradecer a ele por isso, por ter tentado me mostrar o quão maravilhosa sou, independente do nosso comportamento enquanto casalzinho. Hoje eu consigo perceber.
Que Deus o tenha num lugar bastante especial agora. Dentro de mim, o dele já está guardado.
Muitas saudades.









*Embora o combinado seja "apenas" uma postagem por semana, em virtude desse fato extraordinário e de suma importância na minha vida, dessa vez foram duas postagens. Complementares, ainda que não.

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